As criptomedas têm tomado um espaço cada vez maior e chamado maior atenção de investidores. No Brasil, já existem inúmeras exchanges de criptoativos, bem como, ao todo, já se computam mais de mil espécies de criptomoedas emitidas.
Contudo, é importante saber que algumas formas de investimento em criptomoedas ainda não são permitidas no Brasil. Quando digo ainda, isso é porque espera-se que tais investimentos venham a ser regulados em um futuro breve.
Assim, surge a pergunta: é possível investir em fundos de investimentos em criptomoedas no Brasil?
Para responder a essa pergunta, primeiro será preciso analisar como é estabelecida a regulamentação dos fundos de investimento, bem como quais ativos financeiros podem ser objeto de investimento por esses fundos.
Após, será necessário entender se as criptomoedas podem ser, de fato, consideradas ativos para que sejam objeto de investimento de um fundo no Brasil.
O que a CVM regulamentou sobre o funcionamento dos fundos de investimento?
A CVM, Comissão de Valores Mobiliários, é o órgão responsável pela regulação e fiscalização dos fundos de investimento no Brasil, bem como pela distribuição em geral de valores mobiliários.
Em 2014, foi publicada a Instrução CVM Nº 555, a qual regula a constituição, administração, funcionamento e divulgação de informações dos fundos de investimento.
O art. 3º da Instrução 555 traz o conceito de fundo de investimento como:
Art. 3º O fundo de investimento é uma comunhão de recursos, constituído sob a forma de condomínio, destinado à aplicação em ativos financeiros.
Ainda, a instrução define ativos financeiros como:
Art. 2º Para os efeitos desta Instrução, entende-se por:
V – ativos financeiros:
a) títulos da dívida pública;
b) contratos derivativos;
c) desde que a emissão ou negociação tenha sido objeto de registro ou de autorização pela CVM, ações, debêntures, bônus de subscrição, cupons, direitos, recibos de subscrição e certificados de desdobramentos, certificados de depósito de valores mobiliários, cédulas de debêntures, cotas de fundos de investimento, notas promissórias, e quaisquer outros valores mobiliários, que não os referidos na alínea “d”;
d) títulos ou contratos de investimento coletivo, registrados na CVM e ofertados publicamente, que gerem direito de participação, de parceria ou de remuneração, inclusive resultante de prestação de serviços, cujos rendimentos advêm do esforço do empreendedor ou de terceiros;
e) certificados ou recibos de depósitos emitidos no exterior com lastro em valores mobiliários de emissão de companhia aberta brasileira;
f) o ouro, ativo financeiro, desde que negociado em padrão internacionalmente aceito;
g) quaisquer títulos, contratos e modalidades operacionais de obrigação ou coobrigação de instituição financeira; e
h) warrants, contratos mercantis de compra e venda de produtos, mercadorias ou serviços para entrega ou prestação futura, títulos ou certificados representativos desses contratos e quaisquer outros créditos, títulos, contratos e modalidades operacionais desde que expressamente previstos no regulamento;
Como é possível perceber, a Instrução 555 não traz as criptomoedas como uma espécie de ativo financeiro. Ainda, nenhuma das espécies de fundos trazidas nessa instrução elencam o investimento em criptomoedas como uma das possibilidades de aplicação pelo fundo.
É por isso que se diz que os fundos de investimento do Brasil estão proibidos de investir em criptomoedas, pelo menos enquanto a regulamentação não for modificada.
Mas então como existem fundos de investimento que aplicam em criptomoedas? Eles são ilegais?
A resposta é depende. Mas por que depende? Bem, alguns fundos de investimento investem em criptoativos de forma ilegal. Porém, há fundos que investem de forma totalmente de acordo com a lei.
Como assim? Acabamos de ver que as criptomedas não são consideradas ativos financeiros para que os fundos possam investir.
Pois é, verdade. Porém, a Instrução 555 também traz um outro conceito, o chamado ativos financeiros no exterior, o qual é definido como
Art. 2º, VI:
Ativos financeiros no exterior: ativos financeiros negociados no exterior que tenham a mesma natureza econômica dos ativos financeiros no Brasil.
Esses ativos são regulados com maiores detalhes a partir do art. 98 da Instrução CVM 555. É importante dizer que aqueles ativos que estiverem regulados no exterior, ainda que não estejam regulados no Brasil (como é o caso das criptomoedas, cuja regulação existe em outros países) podem ser objeto de investimento dos fundos de investimento brasileiros.
Ou seja, a partir do art. 98 e seguintes, a Instrução 555 permite que se realize o investimento indireto em criptomoedas, isso porque o fundo poderá adquirir cotas de fundos e derivativos, bem como outros ativos negociados em outros países, desde que, nesses países, eles sejam regulamentados.
Por esse motivo, o fundo de investimentos brasileiro que tiver investimentos no exterior poderá, de forma indireta, investir em criptomoedas.
A própria CVM já se manifestou quanto a essa possibilidade por meio do Ofício Circular nº 11/2018/CVM/SIN. Nesse ofício, a CVM afirmou a possibilidade do investimento indireto em criptomoedas, bem como traz alguns cuidados que o administrador do fundo deverá tomar, tais como a observância quanto à legislação no país em que a criptomoeda está sendo negociada, a segurança do ativo, os riscos do mercado, entre outros.
É importante lembrar que os investimentos no exterior não podem ultrapassar 20% dos investimentos do fundo caso sejam destinados ao público em geral. Caso ultrapasse, o fundo deverá ser considerado um fundo para investidores qualificados, e ficará restrito a um público menor.
Mas existem fundos brasileiros que investem diretamente em criptomoedas sem respeitar a Instrução 555. Nesse caso, esses fundos podem estar praticando a distribuição irregular de valores mobiliários, ou até mesmo incorrendo em outros tipos tanto penais quanto administrativos.
De regra, incidirá o come-cotas nesses fundos, tendo em vista a modalidade sob a qual são constituídos.
Por fim…
O investimento em criptomoedas é permitido de forma indireta, por meio de investimento em ativos financeiros no exterior. O investimento direto ainda não é regulado pela CVM. É importante sempre se atentar se o fundo em questão está devidamente registrado e cumprindo os requisitos exigidos pela CVM.
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